REFLEXÕES ACERCA DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA EM MATÉRIA DE INDIGNIDADE SUCESSÓRIA

Autores

  • Patricia Ferreira Rocha Faculdade Cesmac do Agreste

Resumo

O presente artigo tem por objetivo analisar a aplicação do princípio da boa-fé objetiva em matéria de indignidade sucessória, partindo do reconhecimento neste princípio de uma função estabelecedora de um padrão ético de comportamento nas relações jurídicas. Nascido no campo negocial, o princípio da boa-fé objetiva vem estendendo sua incidência pelos demais ramos do direito que tutelam as relações particulares, a exemplo do Direito das Sucessões, área que regula a transmissão do patrimônio de uma pessoa em função de seu óbito. Dentro da seara dos direitos hereditários, o instituto da indignidade se apresenta como um dos campos de atuação da boa-fé objetiva, na medida em que permite a privação da herança ao sucessor que pratique atos que causam repugnância moral, social e jurídica, impedindo-lhe de extrair vantagem do patrimônio daquele a quem ofendeu ou de pessoas da família do morto. Ocorre que, para a maioria dos doutrinadores e julgadores, somente as condutas expressamente tipificadas no art. 1.814 do CCB são passíveis de culminar no afastamento da sucessão, posicionamento com o qual não concordamos em função da própria natureza sancionatória de conteúdo ético que o instituto da indignidade representa, cabendo, para esse fim, realizar uma interpretação finalística da norma a partir do critério da boa-fé objetiva familiar a fim de permitir a exclusão da sucessão em razão de outras condutas igualmente gravosas além daquelas previstas texto legal.

Downloads

Não há dados estatísticos.

Biografia do Autor

Patricia Ferreira Rocha, Faculdade Cesmac do Agreste

Graduada em Direito pelo Centro de Estudos Superiores de Maceió - CESMAC (2003), Especialista Lato Sensu em Direito Ambiental pelo Centro Universitário de Volta Redonda -UNIFOA (2007) e Mestranda em Direito Civil pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE (2016). Experiência docente desde 2009, lecionando atualmente na FAMA - Faculdade de Maceió, nas disciplinas de Direito das Sucessões e Direito das Famílias, e na Faculdade Cesmac do Agreste e no ATC Cursos Jurídicos, ambos na disciplina de Direito das Sucessões. Membro do Núcleo de Apoio à Extensão - NAE, da Faculdade Cesmac do Agreste. Co-orientadora de Projeto no Programa Semente de Iniciação Científica - PSIC. Professora orientadora de Monitoria. Participante do Grupo de Pesquisa "Sucessões - Pesquisa e Direito" coordenado pelo Prof. Dr. Silvio Romero Beltrão e participante do Grupo de Pesquisa "CONREP - Constitucionalização das Relações Privadas" coordenado pelo Prof. Dr. Paulo Luiz Neto Lôbo, ambos da Universidade Federal de Pernambuco - UFPE. Advogada e Conselheira Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil da Seccional de Alagoas para o triênio 2016-2018. Membro-associado do Instituto Brasileiro de Direito de Família e Sucessões - IBDFAM.

Referências

BRASIL. Código Civil Brasileiro de 2002. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm. Acesso: 07/05/2017

______. Código Penal de 1940. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm. Acesso: 07/05/2017

______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm. Acesso: 07/05/2017

______. Superior Tribunal de Justiça. Trata-se de ação ordinária para exclusão de mulher da sucessão de tio, que apresentava problemas mentais por esclerose acentuada, anterior ao consórcio. O casamento restou anulado por vício da vontade do nubente, que também foi interditado a requerimento de uma das recorridas, bem como anulada a doação de apartamento à recorrente. Apesar de o recurso não ser conhecido pela Turma, o Tribunal a quo entendeu que, embora o efeito da coisa julgada em relação às três prestações jurisdicionais citadas reste adstrito ao art. 468 do CPC, os fundamentos contidos naquelas decisões, trazidos como prova documental, comprovam as ações e omissões da prática de maus tratos ao falecido enquanto durou o casamento, daí a previsibilidade do resultado morte. Ressaltou, ainda, que, apesar de o instituto da indignidade, não comportar interpretação extensiva, o desamparo à pessoa alienada mentalmente ou com grave enfermidade comprovados (arts. 1.744, V, e 1.745, IV, ambos do CC) redunda em atentado à vida a evidenciar flagrante indignidade, o que leva à exclusão da mulher da sucessão testamentária. REsp 334.773-RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, julgado em 21/5/2002.

______. Tribunal de Justiça do Estado do Amapá. DIREITO SUCESSÓRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE EXCLUSÃO DE SUCESSÃO (ART. 1.814 DO CC). INDIGNIDADE DA COMPANHEIRA DO DE CUJUS. LATROCÍNIO. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. 1) Constatado que a ré praticou contra o seu companheiro o crime de latrocínio (roubo qualificado pelo resultado morte), em verdadeira afronta aos princípios de justiça e da moral, cabível a interpretação extensiva da disposição contida no art. 1.814 do CC, para reconhecer a sua indignidade e excluí-la da sucessão, evitando-se que a mesma venha a ser contemplada pelos bens deixados por ele. 2) Recurso provido. Apelação Nº 0031105-80.2013.8.03.0001. Câmara Única Do Egrégio Tribunal De Justiça Do Estado Do Amapá. Relator Des. Carmo Antônio. Julgado em 03.03.2015.

______. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. DIREITO DAS SUCESSÕES. INDIGNIDADE. Pretendida exclusão de beneficiário de plano de pecúlio, condenado no âmbito criminal por lesão corporal seguida de morte e ocultação de cadáver. Possibilidade de aplicação do instituto da indignidade em outros campos fora da herança. Incidência do artigo 1.595 do Código Civil de 1916, vigente à época da morte. Rol que não é taxativo. Casos de indignidade que consagram uma tipicidade delimitativa, a comportar analogia limitada. Falta de idoneidade moral do algoz para ser contemplado pelos bens deixados pela vítima. Interpretação teleológica. Enquadramento no espectro finalístico da norma jurídica em análise. Indignidade reconhecida. Sentença reformada. RECURSO PROVIDO. Apelação nº 9215521-04.2007.8.26.0000. 6ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo. Relator Paulo Alcides. Julgado em 15 de agosto de 2013.

CAHALI, Francisco José; HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Direito das sucessões – 4. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.

CÂMARA DOS DEPUTADOS. Projeto de Lei 867/2011. Altera os Capítulos V e X do Livro V do Título I do Código Civil, a fim de dar novo tratamento aos institutos da exclusão da herança, relativamente à indignidade sucessória e à deserdação. Disponível: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=496851. Acesso: 08.05.2017.

CRUZ, Caroline Menegon da. A boa-fé objetiva no direito civil brasileiro. Revista Fórum de Direito Civil – RFDC. Belo Horizonte, ano 2, n. 2, jan./abr. 2013. Disponível em:http://bidforum.com.br/bidBiblioteca_periodico_telacheia_pesquisa.aspx?i=92659&p=70. Acesso: 08/05/2017

DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões – 4. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015.

DICIONÁRIO HOUAISS. Disponível em: https://houaiss.uol.com.br/pub/apps/www/v3-0/html/index.htm. Acesso: 08/05/2017.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, vol. 6: direito das sucessões – 25. ed. – São Paulo: Saraiva, 2011.

FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de direito civil, vol 7: sucessões – São Paulo: Atlas, 2015.

GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo curso de direito civil, vol. 7: direito das sucessões – 4. ed. – São Paulo: Saraiva, 2017.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, vol. 7: direito das sucessões – 6. ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.

GURGEL, Fernanda Pessanha do Amaral. Direito de família e o princípio da boa-fé objetiva – 2. ed. – Curitiba: Juruá, 2012.

LÔBO, Paulo. Direito civil: sucessões – 6. ed. – São Paulo: Saraiva, 2014.

MARTINS-COSTA, Judith. A boa-fé no direito privado: critérios para a sua aplicação – São Paulo: Marcial Pons, 2015.

NADER, Paulo. Curso de direito civil, vol. 6: direito das sucessões – Rio de Janeiro: Forense, 2010.

OLIVEIRA, Euclides Benedito de. Direito de herança: a nova ordem da sucessão – 2. ed. – São Paulo: Saraiva, 2009.

REALE, Miguel. A boa-fé no código civil. 2003. Disponível em: http://www.miguelreale.com.br/artigos/boafe.htm. Acesso: 07/05/2017.

SCHREIBER, Anderson. O princípio da boa-fé no direito de família. Família e dignidade humana. Ibdfam, 2006.

TARTUCE, Flávio. Direito civil, v. 6: direito das sucessões – 9. ed. rev. e atual. – Rio de Janeiro: Forense, 2016.

VAZ, Filomena do Carmo Martins. Indignidade sucessória e deserdação: fundamentos para uma alteração legislativa. 2015. 72 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade de Coimbra, Coimbra, 2015. Disponível em: https://estudogeral.sib.uc.pt/handle/10316/34733. Acesso: 07/05/2017.

VENOSA, Silvio de Salvo. Direito civil, vol. 7: direito das sucessões – 11. ed. – São Paulo: Atlas, 2011.

Downloads

Publicado

2018-02-15

Como Citar

Rocha, P. F. (2018). REFLEXÕES ACERCA DA APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA EM MATÉRIA DE INDIGNIDADE SUCESSÓRIA. Revista Eletrônica Direito E Conhecimento, 1(3). Recuperado de https://revistas.cesmac.edu.br/dec/article/view/696